A conferência de encerramento do VII Congresso Nacional de Educação Católica, promovido pela Associação Nacional de Educação Católica do Brasil, foi conduzida por Ir. Adair Aparecida Sberga, vice-presidente do Conselho Superior da ANEC, e pelo Ir. Paulo Fossatti, conselheiro do CNE e membro do Conselho Superior da ANEC. Em formato de conversa interativa, o momento reuniu diferentes educadores e trouxe uma reflexão profunda sobre os caminhos que a educação católica precisa trilhar para continuar relevante e formadora de sentido diante dos desafios contemporâneos.
A proposta da mesa- redonda foi ampliar a escuta, promover o diálogo e refletir sobre os rumos da formação integral em um tempo marcado por transformações rápidas, complexidade crescente e novas exigências socioculturais. Em meio a esse cenário, a educação católica é chamada a renovar sua fidelidade à missão evangelizadora e ao serviço à pessoa humana.
Ir. Adair destacou que a educação católica, para manter-se significativa, deve “empoderar os estudantes para que se tornem agentes de transformação social”, atentos às exigências do tempo presente e comprometidos com uma cidadania “responsável, equitativa, pacífica e inclusiva”. Neste sentido, Ir. Paulo ressaltou o sentimento de pertencer a uma comunidade “por meio da participação em ações que levem à responsabilidade social com engajamento que faça sentido na vida pessoal-profissional”.
Permanecer relevante: caminhos para a educação católica
Segundo Ir. Adair, a educação católica se distinguiu historicamente por sua “relevância, inovação e espírito de vanguarda”, fundamentada em uma sólida cultura científica, antropológica, filosófica, pedagógica e evangelizadora. Para continuar trilhando esse caminho, ela afirma que é essencial manter-se fiel “ao serviço de uma cosmovisão cristã da vida, ou seja, comprometida com os valores do evangelho conforme os ensinamentos de Jesus Cristo”.
Para que isso aconteça na Educação Católica, ela explica que a pedagogia precisa estar fundamentada na antropologia filosófica — que se encarrega do estudo filosófico do ser humano, a fim de compreender a intencionalidade de sua existência e a sua relação com os demais seres, no contexto da vida real.
Além disso, a pedagogia deve estar integrada à antropologia teológica, visto que “a educação é uma obra que deve adentrar até o profundo da alma do ser humano, já que é aí que está a sua essência pessoal que deve se desenvolver até o último momento da sua vida terrestre, em abertura para a eternidade”. Neste sentido, o que se propõe é uma educação para a interioridade, com o propósito de que a pessoa se empenhe na busca da sua melhor performance, da sua santidade, ou seja, na configuração a Cristo.
Além disso, Ir. Adair propõe um currículo que esteja orientado por “práticas de aprendizagem-serviço e aprendizagem solidária”, que dialogue com “os novos paradigmas das abordagens científicas e culturais, os avanços e limites da tecnologia digital, os processos pedagógicos voltados à construção de habilidades e competências, bem como as demandas da realidade juvenil”.
Ela também destaca a importância de considerar aspectos fundamentais como “questões psicoemocionais e de saúde mental, a educação para o futuro, o projeto de vida dos estudantes, a formação espiritual”, integrados por metodologias que estimulem o protagonismo, a autonomia, o espírito crítico e o compromisso ético.
Para Ir. Paulo, em uma realidade que reconhece nossos jovens como “geração ansiosa”, precisamos, cada vez mais, trabalhar os itinerários formativos que levem à elaboração do projeto de vida dos jovens. “Nestes itinerários é preciso recuperar o eixo da espiritualidade como dimensão antropológica para além das religiões ou igrejas”, explica. “Somente a integração físico-psíquico-racional-espiritual vai dar unidade e sentido à existência humana”.
Formação integral: um compromisso inegociável
A conferência ressaltou a centralidade da formação integral nas instituições católicas. Para a vice-presidenteIr. Adair, esse é um traço distintivo e irrenunciável da identidade da escola católica. “A Educação Católica sempre se destacou por priorizar a formação integral do ser humano, promovendo o desenvolvimento pleno dos estudantes — e é esse o compromisso que deve continuar orientando sua missão.”
“Nenhuma das dimensões antropológicas pode ser negligenciada no processo educativo, pois, como afirma a Laudato Si’, tudo está interligado”, explica. Essa interligação exige um olhar atento à totalidade da pessoa: corpo, mente e espírito.
Na conferência, também foram abordados temas, como: o voluntariado educativo, o engajamento social, e, ainda, a neurodiversidade, a gestão do cuidado, as competências socioemocionais e a complexidade do contexto contemporâneo, como a questão das guerras que envolve a todos nós e é completamente oposto à evangelização da cultura que é o que devemos fazer. O objetivo foi refletir sobre como a escola católica pode continuar formando pessoas completas, capazes de pensar, sentir, escolher e agir a partir de valores que promovem a vida para todos.
“Mais do que um físico, um somático, um corpo, nós somos seres espirituais. E, nesta conferência, destacamos que as mazelas do mundo — aqueles sintomas que discutimos aqui no Congresso, como questões ambientais, sociais, culturais, as diversas crises que estamos vivendo — são sintomas. Elas são consequências de uma vida que perdeu o sentido, porque nós perdemos a nossa essência de seres espirituais, enquanto dimensão antropológica”, afirma Ir. Paulo.
Diálogo com as novas gerações
Ir. Adair reconhece a diversidade das juventudes e a complexidade de suas demandas. No entanto, aponta que há algo que atravessa os diferentes perfis: o desejo de ser acolhido e amado. “Os jovens de hoje anseiam por se sentir acolhidos, pertencentes, valorizados, reconhecidos, amados… Eles têm sede de encontrar espaços e pessoas que lhes favoreçam experiências capazes de promover razões de vida e esperança.”
Em seus contatos cotidianos com estudantes, ela percebe que muitos identificam na escola católica um ambiente humanizador e acolhedor. “Eles salientam que a Escola Católica tem esse perfil acolhedor e humanizador, dizendo que esse diferencial é percebido desde a acolhida na recepção da escola ou universidade”, ressalta.
Os jovens relatam que encontram uma verdadeira “atmosfera de harmonia e cuidado”, tanto nos espaços físicos quanto nas relações humanas. Segundo a Ir. Adair isso é algo que precisamos estar atentos, para “acolher verdadeiramente como Jesus faria”, dando maior atenção aos que têm mais dificuldade de aprendizagem, aos que se isolam, aos que manifestam desafios de ordem pessoal ou familiar, relacional, profissional etc.
A experiência relatada por muitos jovens é de uma escola marcada pela fraternidade, proximidade e sentido de comunidade. “Vive-se um verdadeiro ‘espírito de família’, manifestado em clima de amizade, alegria, respeito, participação espontânea, festividades, correção fraterna, confiança, fraternidade e solidariedade”, afirma Ir. Adair. Para muitos, os momentos de espiritualidade e compromisso social vivenciados no ambiente escolar são sinais concretos da presença de Deus, que impulsiona o amor ao próximo e fortalece o compromisso com os mais pobres.
O conselheiro Ir. Paulo FossattiIr. Paulo ainda reforça que o discurso da educação católica carrega em si a riqueza dos valores evangélicos, de uma antropologia cristã, dos quais não podemos abdicar. “Estes, precisam ser encorajados por meio da pedagogia do diálogo, da escuta, da acolhida e orientação assertiva junto às novas gerações.”
Pertencer para transformar: o papel das escolas católicas na construção do bem comum
No Congresso, foram apontados vários pontos para direcionar esse diálogo, dos quais Ir. Paulo reforça, por exemplo, a vivência por meioatravés da recuperação dos propósitos de uma comunidade, do trabalho em grupo, do trabalho em equipe. “Responsabilidade social, projetos sociais, voluntariado, agremiações — ou seja, o ser humano se realiza, se reconhece na missão, primeiro, de estar com os seus”, destaca.
“Então, as nossas escolas e universidades não são apenas instituições; elas são comunidades onde precisamos fazer a experiência de estar com o outro, para podermos, de fato, agregar valor e sentido humano”, explica. Por fim, o Ir. Paulo deixou um reconhecimento aos educadores presentes no Congresso e seu papel fundamental nas salas de aula.
“Deus se utiliza de nós o tempo inteiro para transformar vidas. […] Nós saímos da vida de tantos e tantos alunos, mas tenho certeza: saímos fisicamente, mas permanecemos existencialmente com eles, inspirando. Nós temos muitos seguidores — seguidores enquanto instrumentos desse Deus que nos usa para levar o bem a tantas pessoas. Obrigado a todos por sermos instrumentos de Deus para aqueles que Ele nos confia, ontem, hoje e amanhã”, conclui.