A 4ª mesa-redonda do VII Congresso Nacional de Educação Católica tratou do tema “Educação em tempos de emergência climática: a agenda da ecologia integral na gestão, no currículo e na formação de atitudes para uma consciência planetária”. O encontro reuniu Marina Oliveira, Aleluia Heringer e Ir. Afonso Murad, que dialogaram sobre o papel das instituições educacionais católicas diante da crise climática e dos desafios de implementação da ecologia integral, conforme os princípios da encíclica Laudato Si’, do Papa Francisco.
A emergência climática foi apresentada como uma realidade já em curso, exigindo ações concretas, tanto nas práticas pedagógicas quanto na gestão institucional. Os palestrantes convergiram ao apontar a necessidade de que a ecologia integral esteja integrada de forma transversal no cotidiano escolar, como uma postura ética, espiritual e educativa. O evento propôs um olhar crítico sobre como as escolas têm contribuído — ou deixado de contribuir — para a formação de uma consciência planetária.
Ao longo da mesa, foram abordadas experiências concretas, critérios de autoavaliação e propostas pedagógicas que articulam currículo, gestão, espiritualidade e comunidade. As falas dos três palestrantes trouxeram elementos complementares para pensar a ecologia integral como eixo estruturante da missão educativa das escolas católicas.
Espiritualidade, território e currículo integrador

A primeira fala da mesa foi de Marina Oliveira, coordenadora do Movimento pela Ética Ambiental e moradora de Brumadinho (MG). Sua trajetória pessoal foi marcada pelo rompimento da barragem da mineradora Vale, em 2019, tragédia que afetou profundamente a sua comunidade.
A partir dessa vivência, ela trouxe reflexões sobre os impactos ambientais e sociais da lógica extrativista e o papel das escolas na formação de sujeitos comprometidos com o cuidado da Casa Comum. “Não dá mais para ter um projeto bonito na escola e, ao mesmo tempo, não ter coleta seletiva, não ter cuidado com a energia, não discutir com os estudantes o que é a crise ambiental.”
Marina afirmou que o território precisa ser parte do currículo escolar, no qual os processos educativos devem considerar os contextos locais e as realidades vividas pelas comunidades. Ela enfatizou que a educação ambiental não pode ser somente informativa, mas transformadora. “Estamos em um momento em que a emergência climática exige que a escola seja formadora de uma nova mentalidade, de novos hábitos”, afirma.
Durante sua fala, Marina defendeu que a ecologia integral precisa se expressar na forma como a escola se organiza, se alimenta, consome e constrói relações. Para ela, o discurso ambiental nas instituições educativas deve se traduzir em práticas cotidianas coerentes, para não perder seu valor pedagógico.
Currículo, gestão e protagonismo institucional

Na sequência, a professora Aleluia Heringer, doutora em educação (UFMG) e ambientalista, aprofundou o debate ao provocar uma reflexão sobre a presença real — e não apenas retórica — da ecologia integral nos projetos pedagógicos e na organização das instituições educativas. Partindo da pergunta “a agenda ecológica está posta na nossa programação?”, ela desafiou os educadores a perceberem a distância entre o discurso e a prática cotidiana. “Grande parte tem [a ecologia integral nos referenciais], mas ainda é discurso. Nós precisamos fazer com que isso sejam práticas vivas.”
Para Aleluia, a formação para a consciência planetária precisa começar pela gestão e pelo currículo. Ela defendeu que a ecologia integral exige uma mudança de estilo de vida, de cultura e de atitude, não sendo possível delegar essa responsabilidade a setores isolados da escola.
Ela ainda destacou que a emergência climática é paradoxal: “É a emergência mais fajuta que existe. A sirene está tocando, o corpo de bombeiros e a ambulância estão vindo com todo vapor, e todo mundo fazendo ‘cara de peixe’. Ninguém reage.” Para ela, essa imobilidade diante da crise climática revela uma desconexão entre o conhecimento disponível e a ação concreta, e a educação tem papel decisivo para reverter essa lógica.
A palestrante também enfatizou a importância da responsabilidade institucional e do planejamento estratégico. “Vocês, presidentes, diretores, coordenadores, têm uma responsabilidade a mais. Vocês determinam espaços, tempos, estrutura, orçamentos”, destaca. A agenda ecológica, segundo ela, só entra na escola se for entendida como valor, e não apenas como resposta a pressões externas. “Se a cultura ecológica não nos toca existencialmente, ela não vai entrar na pauta.”
No campo curricular, Aleluia alertou para a necessidade de rever os itinerários formativos, questionando a coerência entre escolaridade e sustentabilidade. “Os países e as pessoas com mais escolaridade no mundo são as que mais aceleram a mudança climática. Se ter escolaridade significa viver de forma insustentável, devemos rever nossas noções sobre o que significa ser educado”, explica.
Como exemplo de prática concreta, ela compartilhou uma experiência da Rede Lius, dos agostinianos de Minas Gerais, onde os coordenadores pedagógicos mapearam sistematicamente como e onde a temática ecológica era abordada em cada etapa da educação básica. Esse diagnóstico permitiu avaliar e planejar a alfabetização ecológica dos estudantes durante a sua jornada educativa.
Sensibilização, avaliação e transformação de práticas
Encerrando a mesa, Ir. Afonso Murad, professor universitário e pesquisador na Faculdade Jesuita (FAJE), logo no início de sua intervenção, convocou os presentes a uma postura de esperança ativa. “Acho que a gente tem que estar alegre, porque vários de nós que estamos aqui já começamos um movimento de ecologia integral que repercute de frente com a questão das mudanças climáticas”, destaca.

Uma das principais provocações do religioso foi o chamado a superar uma abordagem limitada ao currículo e avançar em direção a mudanças concretas na infraestrutura e na cultura institucional. Ele propôs uma autoavaliação prática, sugerindo que os participantes atribuíssem notas de 0 a 2 ou 0 a 1 em diferentes dimensões da atuação escolar em relação à ecologia integral — como currículo, espiritualidade, energia, resíduos, alimentação, arborização e transporte.
Ao abordar o currículo, Ir. Murad enfatizou a importância das atividades interdisciplinares que integrem os saberes em torno da ecologia, destacando que essa integração deve acontecer desde a educação infantil até o ensino médio. Contudo, ele foi além da dimensão pedagógica, argumentando que a mudança precisa alcançar também o coração e a sensibilidade. “Para mudar a nossa mentalidade, o nosso coração, a gente precisa de experiência sensível. Isso nos leva a esse encantamento, à conversão.”
Ele criticou práticas escolares que ignoram a natureza, mesmo quando cercadas por ela, e reforçou que a espiritualidade ecológica nasce do encantamento, do louvor à criação, da consciência de fazer parte da Terra. “A gente não se deu conta de que a espiritualidade ecológica é essa da gratidão, do louvor a Deus, do se sentir parte”, ressaltou.
Encerrando sua fala, o Ir. Murad fez um chamado enfático à conversão e ao compromisso prático com a ecologia integral. “Nosso desejo é que, ao sair daqui, cada um vá para casa, para o seu colégio, para a sua mantenedora, e dê um passo a mais no sentido da ecologia integral. Nós não podemos voltar para casa do mesmo jeito que a gente chegou”, conclui.